Há muito a Santa Casa de Misericórdia de Cachoeiro de Itapemirim-ES tem histórico de gestão temerária que resulta em mortes e o esvaziamento de profissionais qualificados e experientes. As responsabilidades por esse caos são evidentes, mas os protagonistas fazem vista grossa sem ofertar transparência à população do sul do Espírito Santo.

O responsável maior é o Governo do Estado que, mesmo tendo conhecimento da falência financeira do hospital, omite por incompetência ou por maldade culposa não promove intervenção para salvar o nosocômio do efeito cascada da massa morta, em necrópsia.  Antes, promovem convênios para para manter esse estado de morbidez. Chantageia o hospital, sem auditá-lo, a aceitar mais demandas.

O resultado é a produção de mortes burocratizados como estatísticas sintomáticas com aval do corpo clínico que não reage em denunciar as condições precárias de trabalho, com equipamentos sucateados, atrasos de salários e retenção dos repasses dos SUS e contenção dos sobreavisos. O Governo do Estado não questiona e não se importa com essa calamidade, antes fica indiferente ao estado de caos.

Com o advento da pandemia do COVID-19, a Santa Casa está nua. A Igreja Católica, através da Diocese, é a segunda maior culpada pelas condições nefastas em que se encontra o hospital centenário que jurou compromisso de ficar com as portas abertas para 600 mil pessoas da região. Assumiu a direção da Santa Casa indicando padres incompetentes e perversos. Impõe o símbolo religioso que protege a metástase.

Com R$ 80 milhões em dívida, a terceira força responsável é a classe política. Além do governador,  parlamentares a pretexto de ajudar a Santa Casa, pensando em dividendos políticos, em alguns casos com interesses não republicanos, repassam emendas de milhões e milhões no fosso sem fundo, produzindo mais fissuras no hospital. Parte, a direção, se aproveita das verbas, e a outra, os médicos, fica no limbo.

Os políticos enviam emendas parlamentares milionárias sem compromisso de fiscalizar a aplicação dos recursos. Publicam e fazem marketing sobre a entrega das emendas como propaganda criminosa para receber aplausos de uma claque mais vítima do que beneficiária. Uma covardia. A sociedade nunca recebeu balanço dos gastos desse dinheiro público, descriminado, como manda o princípio da transparência.

A Igreja Católica, por meio dos bispos, por vaidade e a pretexto de praticar caridade, faz expiação desses políticos que por superstição ou malignidade, mantem um status quo de um castelo de areia. O histórico de mortes por negligência e falta de estrutura vem de longe e não justifica a permanência da Igreja na direção da Santa Casa. Poder. O papel da Igreja em relação à Santa Casa deveria se limitar a rezar por ela.

A quarta força culpada por esse estado de coisa é o corpo clínico que não consegue reunir forças para denunciar de forma organizada os flagelos impostos à sociedade e ao mesmo. Os médicos são como elefante presos em cerca de barbante, esperando que alguém aja por eles. Estão atrofiados e falta neles capacidade de indignação. O juramento de hipócrates não está sendo praticado na sua plenitude.

Se os profissionais da ala médica decidissem pela visão libertária do hospital, um novo tempo surgiria, elegendo um médico gestor para o cargo e formando um conselho honesto, competente e composto por representantes da sociedade com membros da OAB, MP, entidades de classes e até o prefeito da cidade que fica protegido do sangramentos de seus munícipes. Não há de invocar jurisdição nesta hora.

Em uma corte internacional, sentariam no banco dos réus o Governo do Estado com seus convênios convenientes; a Igreja Católica com seus padres 'gestores"; os políticos "ementistas" que faturam sobre as indicações e liberações de verbas públicas;  e o corpo clínico por omissão, médicos acovardados e intimidados.

Como está, a Santa Casa permanecerá sem misericórdia.