Uma equipe da Regional de São Mateus da Secretaria de Estado de Saúde estará nesta terça-feira (25) em Ecoporanga, na região Noroeste, para submeterem a teste mais rigoroso as 83 pessoas que deram negativo no teste rápido aplicado pela Secretaria Municipal aplicado nesta segunda-feira (24) nos membros que vivem isolados no Tabernáculo Vitória, no distrito de Santa Terezinha. 


De acordo com autoridades municipais, das 271 pessoas testadas, 188 deram positivo para o novo coronavírus, causador da doença Covid-19, que já provocou mais de 3 mil mortes no Estado e mais de 110 mil no País. Agora, será utilizado o teste swab para a coleta de secreções de naso-orofaringe, que é mais preciso e será aplicado nas demais pessoas da comunidade.


A testagem provocou uma explosão de 33% nos casos positivos em Ecoporanga. Desde que começaram os primeiros casos de Covid-19 em abril, o município havia registrado 599 casos positivos, conforme o último boletim divulgado na sexta-feira passada, dia 21. Mas em um único dia os casos saltaram para 800, segundo dados oficiais divulgados pelas autoridades de saúde da Prefeitura. 


De acordo com o secretário Ricardo Maia, a testagem no Tabernáculo foi uma exigência do Governo do Estado. A Prefeitura de Ecoporanga investiu R$ 136 mil na compra de 1.000 testes rápidos recentemente, mas os testes utilizados na comunidade religiosa foram doados pelo Governo do Estado. 


Apesar do alto índice de contaminação pelo novo coronavírus – 70% da comunidade -, de acordo com o secretário Ricardo Maia, a maioria está assintomática. Os testes foram feitos através da unidade sanitária do distrito de Santa Terezinha, às margens da Rodovia ES 320, que liga a sede do município a Barra de São Francisco.


No boletim desta segunda-feira (24), a Secretaria de Saúde de Ecoporanga procurou minimizar o aumento de mais de 30% nos casos positivos da doença e chamou a atenção para os 444 curados da Covid-19. 


POLÊMICA


A seita Tabernáculo Vitória foi alvo de várias reportagens da imprensa capixaba em 2015, a primeira delas do jornal A Gazeta, demonstrando como seus líderes convenciam os seguidores a venderem seus bens e doarem para a Igreja, num suposto ensaio de uma experiência vivida pela Igreja Cristã Primitiva em Jerusalém, conforme narrado no livro de Atos, da Bíblia Sagrada dos cristãos.


Em 27 de setembro de 2015, em reportagem no jornal A Tribuna, assinada pelas jornalistas Kelly Kalle e Larissa Maestri, fica demonstrado que, mesmo envolta em polêmica, a comunidade estava ampliando suas instalações para receber mais membros. Eles se isolam na região por acreditarem que o dia do juízo final está próximo e precisam estar juntos e preparados para esse dia.


Contaram as jornalistas, na época, que a seita tinha cerca de 300 seguidores, sendo que todos trabalham – dentro ou fora da comunidade – para ajudar no sustento. “Segundo a organização, as pessoas precisam vender todos os bens e entregar o dinheiro e o salário mensal para a coordenação. A comunidade começou em 2008 e não era permitida a visitação de familiares”.


Depois, contaram, essas visitas começaram a ser liberadas e o presidente da seita, Eliel Amaral Soares, explicou que estava aumentando o número de quitinetes para receber mais fiéis e até se programando para abrir para visitação.


Na ocasião, o promotor do Juizado da Infância e Juventude de Vitória, Jerson Ramos, que investigou denúncias do início da comunidade (como pessoas que estavam lá obrigadas), disse que todos no local acreditam que o líder é o representante de Deus na Terra e que todos os desejos e sonhos dos fiéis têm de passar pela aceitação dele.


OBSERVATÓRIO


A estudante de comunicação Ana Paula Gomes Chaves, da Ufes, escreveu em 2 de outubro de 2015, um artigo no site Observatório da Imprensa sobre a disputa de leitores de A Gazeta e A Tribuna explorando o tema do Tabernáculo Vitória. 


“Os diários priorizaram a visão das famílias que viram os parentes convertidos entregarem seus bens para viverem excluídos do convívio familiar. Os fiéis doaram tudo o que tinham para morar nas dependências religiosas, o que tem causado revolta nos familiares.


Segundo o pastor Inereu Vieira Lopes, no sítio localizado em Ecoporanga (doado por um fiel) pretende-se construir um condomínio fechado onde os integrantes viveriam afastados do mundo, plantando para sobreviver. No local, conforme a apuração dos jornais, há 100 homens trabalhando na produção do bem comum. No local haveria também 150 crianças, e o Ministério Público está empenhado em investigar se as crianças estão freqüentando regularmente a escola.


Em entrevista para A Tribuna (25/9), o pastor fala sobre a intenção de criar uma igreja segundo os mandamentos de Cristo que negam o valor dos bens materiais. Considera os dízimos entregues a ele como ‘seu dinheiro’ e diz não ter gasto ainda o dinheiro dos bens doado pelos fiéis. O Ministério Público quer a quebra de sigilo bancário do religioso. Inereu acredita que seu advogado será Deus e que, como Cristo, será traído por um dos integrantes da igreja.


O projeto para o condomínio prevê a construção de 200 chalés de 50 m2, com quarto, cozinha, banheiro e área de serviço. O líder religioso diz acreditar que somente as pessoas inseridas na vida de renúncia dos primeiros cristãos poderão ser integrantes do ‘primeiro rapto’, que seria a volta de Jesus.


O fato tem provocado concorrência de cobertura entre os jornais capixabas. A Tribuna noticiou que em Ecoporanga a nova seita tem suscitado comentários entre os vizinhos. Observadores afirmam que homens trabalham o dia inteiro, em seguida fazem orações e vão dormir. 


Entre os depoimentos, uma mãe diz ter visto seu filho, integrante da Tabernáculo Vitória, vestido com uma camisa onde se lia: ‘Obrigado por cuidar de mim’, com a foto do pastor e a frase ‘O anjo do sétimo dia’. Matéria de A Gazeta compara a situação dos moradores do local com o regime de escravidão. As informações são de que os parentes só podem ter contato com a família convertida se for membro da igreja.”


A futura jornalista Ana Paula fez uma comparação com Canudos, de Antonio Conselheiro, na Bahia, mas não se lembrou de que, em meados do século XX, a mesma Ecoporanga foi sacudida por outro baiano, Udelino Alves de Matos, natural de Alagoinhas (BA), e seu incipiente Estado União de Jeová, pesquisado pelo escritor Adilson Vilaça.  Sobre o tema escreveu também o jornalista Luzimar Nogueira o livro “Massacre em Ecoporanga”. 


Sobre a crença do Tabernáculo, escreveu Ana Paula:
“A crença da igreja Tabernáculo Vitória baseia-se na necessidade de um profeta nos últimos dias. Cita trechos do Velho Testamento como o chamado de Noé a que o povo não deu crédito e a vocação de Moisés para guiar o povo de forma a este não se corromper por falta de profetas. Os fiéis crêem que Deus não fala diretamente com o povo a não ser por um profeta. Consideram Cristo o primeiro profeta da graça (período pós-morte de Cristo), sendo João Batista o último profeta da disposição judia.


A igreja fala dos tempos atuais como instante de ‘contaminação mundana’ e as igrejas, por estarem pobres e frias, necessitariam de um profeta para orientá-las. O círculo lucrativo em que se transformaram as igrejas seriam para os fiéis a ‘apostasia do fim’. Assim, haveria um novo profeta que viria no fim dos tempos para ‘restaurar todas as coisas’. Ele, William Marrion Branham, levaria os fiéis à fé primitiva dos apóstolos, seria um profeta com o mesmo ministério que foi direcionado a Elias e João Batista.


William Marrion Branham nasceu em 1909, nos Estados Unidos, aos 7 anos ouvia a voz de Deus e se converteu aos 14. Durante um batismo de 500 pessoas na Igreja Batista Missionária, ouviu um chamado de Deus para ser profeta assim como foi João Batista.


A igreja Tabernáculo Vitória crê que ele é o sétimo anjo citado em apocalipse. Faleceu em 24 de dezembro de 1965 e deixou gravados 1.200 sermões.


O pastor do Tabernáculo é Inereu Vieira Lopes. Nasceu em Mantena (MG) em 1951. Em 14 de outubro de 1974 se converteu por meio de um casal missionário da Igreja Batista. Em 1983 procurou estudar as doutrinas consideradas hereges conhecidas como ‘A ressurreição isolada do irmão Branham’. Passou a crer no chamado de Branham e, por meio da igreja Tabernáculo Vitória, exerce os ensinamentos deixados por ele. Hoje a igreja tem sedes em Santa Teresa, Vitória, Santo Antônio e uma propriedade em Ecoporanga. Conta com aproximadamente de 400 fiéis” (dados de 2015).

Crédito da Foto: Mauro Cunha - A Tribuna (ES), 27.09.2015