Os países do continente sofrerão este ano a maior recessão de sua História, superando até mesmo os períodos trágicos de 1914 e 1930, alertou nesta terça-feira Alicia Bárcena, secretaría-executiva da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). De acordo com novas projeções da organização, em 2020 o PIB regional sofrerá retração, em média, de 5%, com alguns países, entre eles o Brasil, superando esse percentual. A economia brasileira, informou Bárcena, terá resultado negativo de 5,2%. Já o PIB argentino cairá 6,5% e o da Venezuela 18%.

— Esses dados foram calculados em base a uma queda do PIB dos Estados Unidos de 3,8%. Se a recessão americana for mais profunda, a nossa também será — assegurou a secretária-executiva da Cepal.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) divulgou um relatório no qual estima que a economia brasileira encolherá 5,3% neste ano. Já o ministro da Economia Paulo Guedes afirmou que o PIB brasileiro poderá ter uma queda de 4% este ano.

Em 1914, as economias da região registraram queda do PIB de 4,9%. Este ano, os países da América do Sul, indicou relatório da Cepal, terão recessão, em média, de 5,2%. O comércio, um dos principais motores da economia continental, despencará 14,8%.

— Nossa região já mostrava baixo crescimento há sete anos. A crise da Covid-19 nos pegou com espaços fiscais limitados e crescentes conflitos sociais — comentou Bárcena, profundamente preocupada pelo impacto da crise em matéria de desemprego e pobreza.

Segundo o documento elaborado por técnicos da Cepal, até o momento a estimativa é de que os países da América Latina e o Caribe terminem o ano com 11,6 milhões de novos desempregados, o que representa um aumento de 3,4% em relação ao ano anterior. Pelo menos 30 milhões de pessoas passarão a engrossar a fila de pobres latino-americanos. O número total aumentaria de 186 milhões para 214 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza.

— No caso da pobreza extrema (pessoas que não têm recursos para satisfazer necessidades básicas de alimentação), teremos 15 milhões de novos indigentes — lamentou Bárcena.

Para a secretária-executiva da Cepal, “este é o aspecto mais preocupante da crise”.

— A região tomou medidas imediatas para conter o vírus e proteger a força trabalhista. Mas são insuficientes — frisou.

Linhas de crédito

Neste sentido, a organização defendeu a necessidade de ampliar as linhas de crédito internacionais em condições flexíveis para todos os países da região, argumentando que “esta crise sem precedente requer medidas excepcionais”. Bárcena defendeu, ainda, a proposta de renegociação da dívida pública apresentada pela Argentina semana passada, que prevê redução de 62% dos juros e suspensão dos pagamentos até 2023.

— É uma proposta ousada, mas oportuna — enfatizou a funcionária da Cepal.

Numa região profundamente dependente do comércio internacional, atividade que de acordo com a Organização Mundial do Comércio (OMC) terá queda entre 13% e 32% este ano, a Cepal pregou a importância de caminhar em sentido da regionalização das cadeias produtivas.

— A dependência gera uma enorme vulnerabilidade. Isso é uma das questões que temos de analisar neste momento — comentou Bárcena.

Ela também questionou o alto nível de endividamento dos países da região que alcança, em média, 44,8% do PIB. Este percentual aumentou 15% entre 2011 e 2019. Os países que integram a Cepal destinam 2,6% de seus PIBs ao pagamento de juros da dívida pública, sendo que as despesas em saúde e educação representam, em média, 2,3%.

— O pagamento de juros não nos deixa espaço para gastar em outras despesas. A sonegação, que alcança 6,3% do PIB na região, é outro problema a ser atacado — afirmou Bárcena.

Os países do continente estão mergulhando na maior crise de sua História, na qual cairão o preço de todas as commodities, menos do ouro. O fluxo de capitais provenientes de pessoas não residentes na região perderá em torno de US$ 80 bilhões. O futuro, concluiu a secretária-executiva da Cepal, “será completamente diferente e a desigualdade social continua sendo nosso calcanhar de Aquiles”.