Um dos técnicos mais vencedores do futebol nacional nos últimos 20 anos - só o Brasileirão ele ganhou quatro vezes -, Muricy Ramalho vê com tristeza a situação do esporte no País e tenta encontrar motivos para a seleção brasileira ter perdido sua importância no cenário mundial.
A incompetência dos dirigentes e a falta de comando dos treinadores estão entre os principais motivos da queda de qualidade no futebol do Brasil. Essa é a opinião do hoje comentarista, quinto entrevistado pelo Estado na série especial Futebol em Debate.
Como você avalia o futebol brasileiro?
A gente sempre analisa depois de uma Copa e nossa Copa foi um desastre. Claro que precisamos fazer uma reflexão e tentar mudar algumas coisas, mas isso demora. A CBF vai mudar para uma coisa boa.
Chegou um cara jovem e correto, o Rogério Caboclo. Isso é fundamental. O resto tem que esperar um pouco. O que mais tem dificuldade no futebol brasileiro é que a maioria dos jogadores aparece, já vai embora, e a gente sente a falta da qualidade.
Se a gente trouxesse todo mundo de volta, teríamos um dos melhores campeonatos do mundo, mas não é assim.
O futebol brasileiro está parado, porque a gente revela, o cara vai embora e ficamos na mesma.
Teve a tal mudança após o 7 x 1 como prometido?
Está se mudando aos poucos. Técnicos mais experientes estão parando e os jovens estão chegando. A renovação não é tão fácil. Tem que preparar uma geração para assumir o futebol e não se faz do dia para a noite.
Os times não têm uma filosofia de trabalho e a maioria dos clubes são dirigidos por amadores. A nossa gestão não é boa e não era também na CBF, mas agora vai ficar boa. Estamos engatinhando.
A gente vê muito discurso, palavras bonitas, mas dentro de campo, não tem novidade.
Você gosta de técnicos estrangeiros no Brasil?
Eu vejo como técnico. Não quero saber se ele é japonês, argentino, para mim não interessa. Passaram técnicos estrangeiros e não deram certo, mas no Brasil a gente vai muito por onda.
Depois da Copa, foi a onda dos estrangeiros, mas mandaram todo mundo embora e ninguém servia. Depois, foram os jovens, que também não deu muito certo. Agora estão voltando os experientes.
Temos só um estrangeiro (Sampaoli), que é bom. Temos que olhar para a qualidade dele e não para onde ele nasceu.
O que está pior no Brasil: nível dos jogadores, dos dirigentes ou dos técnicos?
É um pouco de cada. Os clubes precisam se organizar, ter filosofia, trabalho e conceito de jogo. Por exemplo, eu passei um tempo no Barcelona e eles tem um conceito de jogo há mais de 20 anos.
Não é o treinador que vai mudar isso. Aqui ninguém tem ideia nenhuma. Às vezes, contratam o técnico da moda, não dá certo e contratam outro.
Tem que ter filosofia, para depois ir atrás de um técnico. No mundo todo não mudou muita coisa.
Temos visto muitos times brasileiros na retranca. Isso é medo do treinador perder o jogo e o emprego?
Não tenho a menor dúvida. Tem a insegurança dos contratos. Eu, depois de anos, passei a ter multa, mas os mais jovens não tem essa segurança.
O cara faz contrato de dois anos, é mandado embora amanhã e não acontece nada. Trabalhar sem segurança você não consegue trabalhar direito, então o jeito é se proteger.
Joga pelo resultado? Sim, só pelo resultado, porque se não tiver resultado, ele é mandado embora.
Você acredita que a seleção brasileira perdeu a identidade?
O que aconteceu é que de uns anos para cá, os europeus vieram para o Brasil buscar a nossa técnica e como jogar bonito.
Eles tinham a força, a educação e a leitura de jogo, mas faltava a qualidade. Eles vieram aqui,estudaram e melhoraram a qualidade deles e nós fizemos o contrário e fomos buscar a força deles.
Inverteu tudo. Ficamos com a força dos europeus e eles com a nossa técnica.