Apesar de o presidente Jair Bolsonaro ter postergado por 60 dias o reajuste dos medicamentos no Brasil, a pandemia global do novo coronavírus já está encarecendo a fabricação de remédios no país.

 

A decisão de Bolsonaro é classificada como “ineficaz” pela advogada Ana Navarrete, especialista em saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

“O reajuste não incide diretamente sobre os preços dos medicamentos, mas sim sobre o teto de preços. Como esse teto é muito elevado, na prática ele não limita os preços desses produtos. É uma medida cosmética”, diz.

 

O preço máximo de remédios no Brasil é definido pela Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), do Ministério da Saúde, com reajustes anuais em abril. Mesmo com o adiamento do aumento neste ano, as fabricantes já possuem margem para subir os preços dentro do atual limite legal. É por isso que o medicamento referência contra a hepatite C é comercializado no país por valores entre R$ 65 e R$ 957.  

 

As fabricantes nacionais de remédios avaliam subir o preço dos produtos em razão de gastos extras na produção provocados pela pandemia. O maior entrave é a dificuldade de importar produtos da China e da Índia, que fornecem para a indústria nacional a maior parte da matéria-prima usada na fabricação.

 

O Brasil importa atualmente 90% desses ingredientes básicos, principalmente dos gigantes asiáticos. Com a suspensão de voos, o isolamento social e a redução da atividade econômica nos dois países, a importação desses produtos está comprometida. Há empresas brasileiras que já pagaram pelos insumos, mas os lotes não foram enviados. 

 

A dependência externa do Brasil é criticada por diversos especialistas, como o médico Dráuzio Varella: “Dependemos de importações de remédios de outros países. A China e a Índia são os que mais vendem genéricos para o mundo inteiro. Tem cabimento o Brasil, com tanta gente preparada, ter que importar esses medicamentos de outros países? Isso é ridículo”, afirmou em entrevista ao podcast Café da Manhã, da Folha de S. Paulo.   

 

“Uma crise como essa explica por que precisamos de políticas públicas de investimento [na indústria nacional]. A justificativa em última instância é termos capacidade interna diante de momentos de dificuldades externas, como o atual, para não ficarmos completamente vulneráveis”, afirma Paranhos, da UFRJ.