A cientista de dados Frances Haugen, ex-funcionária do Facebook que liberou à imprensa documentos da empresa após deixar seu cargo em maio deste ano, critica a falta de transparência dos investimentos feitos pela companhia para combater desinformação e discurso de ódio na América Latina e em países como Mianmar e Índia.

O Facebook tem sistemas de inteligência artificial e equipes humanas que trabalham para detectar e remover posts contrários às diretrizes da rede social. Documentos revelados por Haugen até agora mostram a dificuldade da plataforma em priorizar recursos para países de fora da América do Norte.

A Índia, um dos principais mercados do Meta (novo nome do Facebook Inc.), não recebe recursos suficientes para que as 22 línguas oficiais do país sejam reconhecidas, por exemplo. Para Haugen, o Brasil pode ser vítima do mesmo problema.

“Uma das coisas que mais dissemina conteúdo violento é o fato de pessoas o recompartilharem em grandes grupos. Ele viraliza dessa forma. Desconfio que o português do Brasil não seja bem amparado pelos sistemas de segurança”, afirmou à reportagem por email.

Ela refere-se aos sistemas de inteligência artificial que detectam conteúdos nocivos e pontencialmente virais na plataforma.

Em nota, o Meta afirma que possui especialistas brasileiros em diferentes localidades e baseados no país e que tem investido de modo significativo em pessoas e tecnologia para aplicar suas políticas em dezenas de idiomas, incluindo o português.

 

“Devemos investir mais de US$ 5 bilhões globalmente em segurança e integridade apenas em 2021, e temos 40 mil pessoas dedicadas a essas áreas”, acrescenta.

Um relatório interno do Facebook, noticiado no domingo (6), recomenda que seja examinado “seriamente por que a violência explícita continua a ter um alcance maior no Facebook e no WhatsApp no Brasil”.

A informação faz parte dos chamados Facebook Papers, relatórios internos enviados à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos (SEC, na sigla em inglês) e fornecidos ao Congresso americano de forma editada, com ocultação de nomes, pelos advogados de Frances Haugen.

O investimento escasso do Facebook em outros países, tema já abordado por ativistas e confirmados nos documentos vazados por Haugen, é tido com uma entre as causas para a alta disseminação de conteúdo violento, de ódio ou desinformativo em países menos desenvolvidos.

 

O Brasil aparece em uma lista dos países considerados prioritários para ações de combate ao uso nocivo da plataforma em 2021. Está no mesmo grupo que Nicarágua, Arábia Saudita, México, Turquia, Argentina, Irã, Indonésia, Alemanha, França e Honduras.

Tema movimenta MPF no Brasil Autoridades brasileiras expressam a mesma preocupação sobre o investimento em ferramentas de inteligência artificial dedicadas ao Brasil especificamente.

O Ministério Público Federal instaurou inquérito na terça-feira (9) e solicitou que o Facebook informe qual o percentual das remoções de conteúdo da plataforma decorre de análise humana, se a rede opera com inteligência artificial adaptada ao idioma português nas ações de detecção e remoção de conteúdo e quanto investiu nos últimos três anos para “mitigar práticas organizadas de produção e de circulação de conteúdos que veiculam desinformação e violência digital no Brasil”.