Uma dona de casa de Praia Grande, no litoral de São Paulo, viu na adoção a oportunidade de preencher a saudade de cuidar das crianças. 

O que ela não imaginava é que, anos depois, estaria com 18 filhos adotivos, dois biológicos e sete netos.

Cleusa Ribeiro dos Santos Nascimento, de 45 anos, é paranaense, filha de um pedreiro e uma costureira naturais de Sergipe. Ela é a sexta filha do casal – depois dela nasceram mais dois.

Na infância, sua casa estava sempre cheia e ela gostava daquela agitação, até que se casou, aos 16 anos, e teve de se adaptar a uma nova rotina: somente ela e o marido, o técnico em saneamento Jorge Queiroz do Nascimento, que hoje tem 47 anos.

Mesmo depois de ter dois filhos, o vazio continuava e ela decidiu propor ao esposo que adotassem uma criança. Ele aceitou, mas nenhum dos dois imaginava que dali a alguns anos chegariam à marca de 20 filhos.

Primeira experiência

Em 2003, aos 30 anos, ela já havia tido a experiência de cuidar de uma jovem. Paula tinha 25 anos e conheceu Cleusa em uma igreja. "Ela chegou desesperada, dizendo que estava sendo despejada. Eu disse que na minha casa, no fundo, tinha um quarto e um banheiro", conta a dona de casa.

Apesar de terem quase a mesma idade, Cleusa diz que a considera como sua primeira filha adotiva. "Considero ela como filha. Também ajudei a criar um pouco a filha dela, que hoje está com 18 anos".

À época, o casal conseguia manter uma estabilidade financeira e fazer algumas viagens por ano. Mas o dinheiro não preenchia a solidão que Cleusa sentia.

"Quando tinha dois filhos eu viajava todos os anos. A viagem durava três a cinco dias. Depois, o marido tinha que trabalhar e o resto do ano era chato. Hoje em dia eu não fico mais sozinha".


Seis irmãos

Em uma tarde de outono de 2007, Cleusa saiu de casa determinada a buscar informações que pudessem levá-la de encontro com sua mais nova futura filha. 

Ela ainda morava no distrito de Vicente de Carvalho, em Guarujá (SP), e seguiu até o fórum.

Ela já era mãe de Laiane e Rafael, mas os dois estavam entrando na adolescência e ela sentia saudades dos tempos em que a casa era tomada por brinquedos e a agitação típica das crianças.

Um ano e meio após a primeira ida ao fórum, ela se viu em um abrigo, encantada com seis irmãos. A ideia, explica Cleusa, era adotar apenas uma menina, mas a história de uma garota de 9 anos chamou sua atenção.

"A psicóloga de lá me apresentou a ela. A menina não queria nem olhar para mim, mas quando olhou, ela falou: ‘o nome da minha mãe que morreu era Cleusa’. Aí ela pegou na minha mão e foi me apresentar aos irmãos", lembra.

O sobrenome da mãe da menina também era quase o mesmo que o de Cleusa. "Meu nome é Cleusa Ribeiro dos Santos Nascimento, e o da mãe dela era Cleusa Nascimento Ribeiro".

"Deus colocou um desejo muito grande que eu queria aquelas crianças de qualquer jeito. Fui no fórum para ver se conseguia e, chegando lá, a assistente falou que eu estava ficando louca, falou que não era para adotar".

O balde de água fria não a desanimou. Ela continuou esperando e, no ano seguinte, conseguiu adotar cinco dos seis irmãos, em outubro de 2009. O pequeno Felipe foi o único que continuou por mais tempo no abrigo. "Ele tem paralisia cerebral, daí falaram que quando a gente se acostumasse poderíamos ficar com ele. E conseguimos. Ele chegou no dia 30 de março de 2010".

De repente, nove

Em meio a esse processo, Cleusa conheceu outras duas crianças em um abrigo na cidade de São Vicente (SP). Meses depois, lá estava ela, com dois irmãos, de 6 e 2 anos – pouco antes da chegada dos seis.

Em 2010, Cleusa e o marido já somavam nove filhos adotivos. Ela levou a sério o dito de que em coração de mãe sempre cabe mais um e pensou: "por que não adotar mais dois?". E assim, no ano seguinte, Esther, de 11 anos, e Davi, de 9, chegaram para elevar o número de filhos para 11.


Boas-vindas ao 12º

Pedro, de 11 anos, foi a 12ª criança a integrar a grande família, em 2012. O menino, aliás, era conhecido pelo comportamento difícil. Pouco antes de ficar sob os cuidados de Cleusa, ele chegou a atear fogo na casa de uma família.

"Como ele aprontava, a psicóloga falou que eu ia ficar com ele aos poucos, primeiro só aos finais de semana. Só que comigo não acontecia nada. Ele gostou da minha casa. E ele já era amigo do Davi no abrigo, então era como se tivesse um irmão em casa", conta.

Em 2013, Cleusa deu as boas-vindas a Jéssica, de 18, que chegou acompanhada da filha de dois anos. Ela tentou adotar a menina quando estava com 17, mas o processo demorou e, quando atingiu a maioridade, a jovem foi direto para a casa da futura mãe.

No ano seguinte, a família se mudou de Vicente de Carvalho para Praia Grande porque precisavam de uma casa maior. Eles fizeram algumas modificações e hoje o imóvel tem seis quartos, sala, cozinha, dois banheiros, garagem e quintal.

Morte de um filho

Em 2014, Cleusa estava com 13 filhos adotivos, dois biológicos e uma netinha de coração. Mas uma fatalidade tirou de Cleusa o filho biológico Rafael, aos 23 anos. "Ele foi pegar o carro, um bandido chegou para assaltar e deu uma facada. Ele morreu na hora", lamenta.

Meses após a morte de Rafael, em dezembro, Cleusa e o marido se viram pensando novamente em adotar. "Meu marido falou que não ia adotar, mas acabou gostando da Letícia porque ela era muito palhaça. Ela alegrava o pai", diz.

Fugas

O processo de adoção de Letícia, de 14 anos, ficou pronto em janeiro de 2015. No mesmo ano, chegaram Felipe, de 17, e Stefani, de 14. "A Stefani deu trabalho. Ela tinha costume de fugir, e eu não sabia. Tive que fazer boletim de ocorrência e ela voltou uma semana depois. Fui fazer BO de reaparecimento e ela quis voltar para o abrigo. Uns seis meses depois ela voltou e hoje está morando comigo. Tem 18 anos".

Cleusa chegou a ser processada porque a garota fugiu quando estava sob seus cuidados. "Um promotor de Praia Grande me processou porque ela fugiu, mas não deu em nada, o advogado conseguiu liberar. O que importa é que ela está bem".

Sempre cabe mais um

E por que 16 se você pode ter 17 filhos adotivos? Foi assim que a Thalita chegou, mas de forma diferente dos demais. "Ela morava de aluguel e foi mandada embora. Uma amiga me perguntou se eu podia ficar com ela e eu aceitei".

Eloísa, a 18ª filha, chegou à casa de Cleusa quando já estava com 18 anos. Ela tinha engravidado no abrigo e ficou morando com Cleusa por alguns meses. "Hoje ela mora com a mãe biológica".

Despesas

Cleusa vive atualmente com 15 filhos, contando com Laiane, a filha biológica. Os demais já cresceram e tomaram novos rumos.

A jovem, que está com 22 anos, trabalha e ajuda com o que pode. Felipe, o garoto com paralisia cerebral, ganha uma pensão devido à doença e o dinheiro vai direto para despesas com medicamentos e consultas. Os demais gastos ficam por conta do marido de Cleusa.

Ela conta que as despesas mensais giram em torno de R$ 9 mil. A família consome diariamente 2kg de feijão, 2,5 kg de arroz, 3 kg de mistura e 12 litros de suco.


Aprendizado

Cleusa afirma que não trocaria o que tem hoje pelos tempos em que tinha dinheiro sobrando, mesmo vivendo "no aperto", com várias despesas a pagar e sem poder reformar a casa.

"Naquela época eu era muito egoísta. Olhava só para o meu umbigo, mesmo tendo dois filhos. Hoje eu aprendi a repartir o que eu tenho. Tudo que tenho eu penso nos outros. Depois que adotei eu virei outra pessoa, eu cresci. É um sonho realizado".

Ela diz que não pensa em fazer uma nova adoção, mas não descarta a possibilidade de voltar a acolher crianças temporariamente. "Não sei se eu quero adotar mais, mas eu gostava de ser lar de apoio. Sinto saudade de trazer criança para casa", finaliza.