A Assembleia Legislativa de São Paulo será palco de uma ofensiva da base do governo João Doria (PSDB) com abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito contra o que os deputados definem como "aparelhamento de esquerda" das universidades públicas paulistas e "gastos excessivos" com funcionários e professores. Entre as mudanças que eles querem discutir estão a escolha do reitor e a forma como o Estado repassa recursos às instituições, ambas garantidas hoje pela chamada autonomia universitária.

O diretor da Faculdade de Direito da USP, Floriano de Azevedo Marques, disse que intervir nas universidades é inconstitucional. "A autonomia universitária, que diz que a instituição conduz seus assuntos acadêmicos e indica seus dirigentes, é absolutamente impenetrável porque vem da Constituição." Tanto ela quanto a liberdade de cátedra foram reafirmadas em 2018 pelo Supremo Tribunal Federal, que tem entre os membros dois ex-colegas de faculdade de Marques - Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski -, no julgamento sobre a censura a manifestações acadêmicas na eleição.

Apresentada pelo deputado Wellington Moura (PRB), vice líder do governo, a CPI das Universidades Públicas será instaurada nesta semana. O objeto divulgado no Diário Oficialé vago: "investigar irregularidades na gestão das universidades públicas". Entre as justificativas apresentadas oficialmente está o fato de as universidades de São Paulo (USP), Estadual Paulista (Unesp) e Estadual de Campinas (Unicamp) receberem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. O valor atual está em torno de R$ 9 bilhões.

"Vamos analisar como as questões ideológicas estão implicando no orçamento. Eu percebo um predomínio da esquerda nas universidades. Infelizmente, muitos professores levam mais o tema ideológico do que o temático para a sala de aula", disse Moura. Líder do PSDB na Assembleia e aliada de Doria, a deputada Carla Morando afirmou que é "público, notório e amplamente divulgado pela imprensa" que as universidades públicas são "dominadas pela esquerda" em seus cargos de gestão e no ambiente educacional. Para ela, as universidades são uma "caixa-preta".

Há exatos 30 anos, em 1989, decreto do então governador Orestes Quércia vinculou recursos do ICMS para USP, Unesp e Unicamp e a total autonomia para geri-los. Além disso, a Constituição de 1988 garante a autonomia às universidades no País, o que significa ser responsável por escolher dirigentes e colegiados, currículos, programas, etc.

Desde a autonomia, a USP aumentou em mais de 1.100% o indicador de produção científica que se refere a publicações de trabalhos em revistas conceituadas mundialmente. O número de alunos de graduação cresceu 50% e o de teses defendidas, 400%. Nos últimos anos, as três universidades enfrentaram problemas financeiros e, em razão da autonomia, não puderam pedir mais dinheiro ao Estado. E chegaram a ter mais de 100% dos orçamentos comprometidos com folha de pagamento.