O Ministério Público do Estado do Espírito Santo protocolou denúncia, em Ação Civil por Atos de Improbidade Administrativa, em face do prefeito de Fundão, Joilson Rocha Nunes, conhecido como “Pretinho”, o secretário Municipal de Turismo, Cultura e Lazer, Gabriel Martini, o empresário Christian Pinto Faria e a empresa Classe Locação de Equipamentos e Entretenimentos, Serviços e Mão de Obra Eireli, localizada no bairro Jardim América, em Cariacica.

 

O MPES pede que o valor da causa seja fixada em R$ 805.680,00.

 

De acordo com o MPES, Inquérito Civil nº 2018.0004.51 34-67 apurou eventuais irregularidades no Processo Administrativo PMF nº 8589/17, destinado à contratação de empresa para prestação de serviços de iluminação, sonorização e locação de palco em Fundão.

 

Na denúncia, o MPES cita que restou apurado que, durante as eleições municipais de 2016, a empresa Classe Locação prestou serviços para a campanha de Anderson Pedroni, candidato à prefeito, que então pertencia ao mesmo grupo político de Pretinho, que era candidato à vice-prefeito na mesma coligação.

 

 

O empresário Christian Faria prestou depoimento no curso da apuração do Ministério Público e asseverou que os serviços de palco e som prestados durante a campanha eleitoral foram cobrados e declarados pela empresa em valores abaixo do preço de mercado.

 

Em troca, Anderson Pedroni e seu grupo político, do qual fazia parte o prefeito Pretinho, se comprometeram a considerar a proposta de futura contratação da empresa pela Prefeitura Municipal de Fundão, caso conseguissem se sagrar vencedores no pleito eleitoral.

 

 

“Vale registrar que Anderson Pedroni teve sua candidatura indeferida pela Justiça Eleitoral, realizando-se eleições suplementares, oportunidade em que Pretinho se candidatou e foi eleito Prefeito Municipal, tendo tomado posse em 27 de outubro de 2017”, diz o promotor de Justiça Egino Rios, na denúncia.

 

 

À época da posse do prefeito Pretinho (foto), a Prefeitura já tinha contrato recém firmado com a empresa “Scorpion Telões Ltda” (Contrato nº 032/2017), destinado à prestação de serviços de iluminação, sonorização e locação de palco, que estava em plena execução e atendia as demandas existentes.

 

Contudo, tendo em vista o compromisso político firmado ainda durante a campanha eleitoral, Pretinho e Gabriel Martini, “enquanto agentes políticos recém empossados, passaram a adotar medidas escusas destinadas a permitir a contratação, em substituição, da empresa Classe Locação, retribuindo-se, assim, o ‘favor’ que deviam a Christian Pinto Faria”, explica a denúncia.

 

 

Para tanto, prossegue a Inicial, o secretário Gabriel decidiu não mais executar o contrato vigente que o Município de Fundão tinha com a empresa “Scorpion Telões”, ainda em fase inicial, deliberando por nova contratação para a prestação do mesmo serviço.

 

 

Diz a denúncia que Gabriel Martini alegava que o “Contrato nº 032/2017” não atendia as necessidades dos eventos promovidos pela Prefeitura. Entretanto, afirma o MPES, “não apresentou justificativas e dados concretos que pudessem embasar tal alegação. Houve apenas a alegação genérica e frágil de crescimento do turismo local, além do argumento de que o tamanho do palco previsto no contrato não comportaria todas as comemorações municipais”.

 

 

Em 11 de dezembro de 2017, o secretário de Turismo, Gabriel Martini, deflagrou o “Processo Administrativo PMF nº 8589/2017”. De início, informa o Ministério Público na denúncia, foi externado o objetivo de realizar o procedimento licitatório regular, na modalidade registro de preços, tendo por base termo de referência elaborado pela própria Secretaria Municipal de Turismo, Cultura e Lazer.

 

“Ocorre que o processo administrativo em referência ficou paralisado no Setor de Licitação da Prefeitura nos meses que se seguiram, sendo que, no dia 03 de fevereiro de 2018, às vésperas do Carnaval, o processo foi encaminhado à Secretaria de origem, a pedido, tendo sido juntada a ‘Ata de Registro de Preços nº 005/2017’, através de despacho emitido por Gabriel Martini, que alegou que ‘encontrou’ a ata através de pesquisas. O gestor solicitou a imediata adesão, reiterando na fala de que o contrato existente não atendia às necessidades do governo”, completa o Ministério Público na denúncia.

 

 

Nessa ata de registro de preços, segundo o MPES, figurava como vencedora a empresa Classe Locação de Equipamentos e Entretenimentos, Serviços e Mão de Obra Eireli, originária do “Consórcio Intermunicipal Multifinalitário do Vale do Aço”, “tendo por base a distante cidade de Ipatinga/MG”.

 

O secretário Gabriel Martini, ao ser ouvido durante as investigações, afirmou que não conhecia previamente a empresa Classe Locação e que teve acesso à “Ata de Registro de Preços nº 005/2017”, por acaso, através de pesquisas realizadas na internet.

 

 

“Contudo, tal versão não é verídica e evidencia a má-fé do gestor, uma vez que a empresa em referência já havia declaradamente prestado serviços à campanha eleitoral do grupo político de Joilson Rocha Nunes (Pretinho), tendo sido firmado um compromisso de contratação para retribuição dos favores prestados durante as eleições, conforme asseverado pelo próprio representante legal da empresa interessada. Além disso, conforme apurado durante as investigações, antes mesmo da juntada da ata ao processo administrativo, Gabriel Martini já havia conversado com Christian Pinto Faria e solicitado que a empresa prestasse alguns serviços à Prefeitura, sob a promessa de que seria contratado e compensado no futuro”, diz a denúncia.

 

 

Para o MPES, desde sua origem, o “Processo Administrativo PMF nº 8589/2017” foi indevidamente “direcionado para permitir a contratação da empresa Classe Locação em substituição ao contrato que estava em execução regular, em flagrante ofensa aos princípios da impessoalidade e da legalidade”.

 

Para o Parquet, “muito embora o procedimento de adesão à ata de registro de preços pela Administração Pública seja prática permitida pelo ordenamento jurídico e adotada por vários entes públicos, no caso concreto, a tramitação do processo administrativo em referência revelou uma série de ilegalidades e inconsistências graves, evidenciando a existência de dolo e má-fé por parte dos envolvidos”.

 

A partir da inclusão da “Ata de Registro de Preços nº 005/2017”, o processo administrativo passou a tramitar de forma acelerada, sem a adoção das cautelas de praxe, deixando de observar os procedimentos e as diligências que seriam imprescindíveis para a regularidade do certame.

 

 

As cotações de orçamentos para o balizamento dos preços não foram devidamente analisadas pelo gestor solicitante, que deixou de apreciar a “vantajosidade” da adesão à ata, em todos os seus itens e lotes, através de ato fundamentado.

 

Segundo o MPES, não há nenhum registro dos servidores que efetuaram a cotação de preços e em que circunstâncias a diligência foi realizada, o que revela irregularidade grave. Por se tratar de procedimento administrativo formal, a ausência do nome dos servidores responsáveis pela diligência revela omissão proposital e deliberada, com a adoção de expedientes não usuais. As cotações foram colhidas de forma rápida e sem ampla pesquisa mercadológica.

 

“Tal circunstância foi devidamente alertada pelo parecer jurídico emanado pela Procuradoria Geral do Município”, ao constar a importância de que fosse “realizada a mais ampla pesquisa de mercado possível” e da necessidade de “colação de mais documentos que tragam uma maior segurança na obtenção do preço de mercado que os três orçamentos já presentes nos autos”.

 

A denúncia registra ainda “a pressa não usual dos gestores em firmar e formalizar a contratação”. Segundo o Ministério Público, alguns dos pedidos de cotação de preço e apresentação de orçamentos se deram no dia 8 de fevereiro de 2018. O quadro comparativo de preços foi elaborado no dia 09/02/2018, às 14h54min. O despacho de fl. 314, emanado do secretário Gabriel Martini, é datado do mesmo dia 09 de fevereiro de 2018, ocasião em que pediu o prosseguimento do processo e juntou alguns documentos, que sequer foram analisados.

 

“O parecer jurídico da Procuradoria também foi emitido na mesma data. A autorização para adesão à ata foi dada pelo prefeito Pretinho no dia 09 de fevereiro de 2018, também sem análise de mérito, tratando-se da mesma data em que o contrato nº 036/2018 foi elaborado e assinado pelas partes interessadas”, frisa a denúncia.

 

“Como é evidente, por se tratar de diversos atos complexos praticados em um mesmo dia, não havia tempo hábil para que todas as diligências elencadas fossem executadas, registradas, tramitassem entre os diversos setores da Prefeitura e publicadas na imprensa oficial, indicando a montagem do processo e o direcionamento da contratação. Foi feita a adesão, ao todo, de 5 (cinco) lotes da ata originária, conforme descritas no anexo I do Contrato nº 036/2018, com previsão contratual de execução de serviços orçados em R$ 805.680,00, relevando montante elevado e incompatível com as necessidades do pequeno município de Fundão, carente de recursos públicos, de infraestrutura básica e de serviços públicos essenciais”, salienta o MPES.

 

Ainda de acordo com o MPES, o contrato anterior até então vigente (nº 032/2017), firmado alguns meses antes com a empresa “Scorpion Telões”, tinha valor estimado em $ 270.300,00, “reforçando o entendimento de que a nova adesão à ata, nos termos em que foi formatada, não revelava economicidade ou vantagem ao erário. Ao contrário, abria as portas para que os gestores aumentassem exponencialmente os gastos com festas e eventos, beneficiando indevidamente a empresa Classe Locação, que teve a contratação nitidamente direcionada em seu favor, em razão de prévio acerco político-eleitoral, o que é altamente reprovável”.

 

Conforme dados oficiais obtidos no Portal da Transparência da Prefeitura Municipal de Fundão, em cerca de apenas um ano de execução contratual (fevereiro de 2018 a janeiro de 2019), foram liquidados e pagos à empresa Classe Locação, ao todo, R$ 249.435,50.

 

O que mais causou estranheza ao Ministério Público é que a autorização de adesão à ata e a celebração do contrato se deram no dia 09/02/2019, isto é, no mesmo dia em que a empresa começou a prestar formalmente os serviços, em razão das festividades de Carnaval no balneário de Praia Grande, que ocorreram nos dias 09, 10, 11, 12 e 13 de fevereiro de 2018.

 

“Por evidente, não houve a prévia publicação da decisão de adesão à ata e do respectivo contrato firmado entre as partes, tendo sido iniciada a execução formal dos serviços de forma manifestamente clandestina e irregular”, diz a denúncia.

 

Para o MPES, diante das particularidades do caso, “é certo que os gestores municipais já haviam previamente acertado a contratação com a empresa, ainda que de maneira informal e sem a prévia formalização administrativa, autorizando a prestação dos serviços durante o Carnaval, que é justamente o evento festivo mais extenso e que era dotado de aptidão de gerar maior remuneração para a empresa”.

 

Para o Parquet, não há como se alegar que o prefeito Pretinho e o secretário Gabriel Martini desconheciam a situação, uma vez que tiveram acesso direto ao procedimento administrativo e despacharam nos autos, autorizando a contratação.

 

“Ademais, os requeridos estiveram presentes durante todos os preparativos para as festividades do carnaval de 2019 em Praia Grande, tendo conhecimento de que a empresa, alguns dias antes, estava montando os palcos e demais equipamentos de som e luz, mesmo sem a formalização de contrato e ordem de serviço”, pontua a denúncia.

 

O empresário Christian Faria (foto) prestou depoimento na Promotoria de Justiça de Fundão e “confirmou tal cenário de gestão ímproba, asseverando que prestou serviços antes mesmo da formalização do contrato, sob a promessa dos gestores de que o impasse seria resolvido no futuro e que a empresa seria compensada”.

 

Neste sentido, declarou que “foi procurado pelo secretário Municipal de Turismo, Gabriel Martini, que disse que teria interesse na ata, pois seria completa, e perguntou se o depoente teria interesse em firmar a ata também em Fundão”.

 

Enquanto isso, “em contradição evidente”, Gabriel Martini foi ouvido e afirmou que “não conhecia o representante legal da empresa, de nome Christian, e que somente o conheceu por ocasião da execução futura do contrato”.

 

Christian Faria também declarou que, em janeiro de 2018, chegou a prestar serviços à Prefeitura Municipal de Fundão de “graça”, sem qualquer formalização contratual, diante do compromisso dos gestores requeridos de que a adesão iria ocorrer e que a empresa receberia todos os pagamentos no decorrer da execução do contrato.

 

Nos meses que se seguiram, durante a execução contratual, as ilegalidades continuaram, afirma a denúncia. Conforme apurado, diversos serviços foram prestados pela empresa, a pedido dos próprios gestores municipais, “despidos de ordem de serviço formal e de dotação orçamentária suficiente, em manobras ilícitas articuladas entre os requeridos para burlar a falta de recursos e os limites contratuais. Tudo sob a promessa de que o empresário seria compensado no decorrer da execução contratual, o que revela prática manifestamente imoral”.

 

Neste ano de ano de 2019, ao perceber que os gestores não conseguiriam cumprir com as promessas, o empresário Christian Faria rompeu a relação amistosa e passou a cobrar formalmente da Prefeitura Municipal de Fundão pelos serviços prestados de maneira informal, tais como a “Festa de São Benedito”, “Festa Junina do Assentamento Piranema”, “Festa de Emancipação Política”, “Festa do Dia dos Pais”, “Evento Prevenir do Corpo de Bombeiros” e “Evento Feirarte”, pedindo indenização em valor estimado de R$ 112.472,00.

 

“Assim, os atos de improbidade ora imputados foram materializados através do direcionamento indevido da contratação e da inobservância das formalidades necessárias e imprescindíveis para a adesão à ata de registro de preços. Além disso, os atos ímprobos foram perpetrados antes e durante a execução contratual, permitindo-se a prestação de serviços sem a devida ordem formal e lastro orçamentário”, conclui a denúncia.

 

Para o Ministério Público, GABRIEL MARTINI, enquanto secretário Municipal, “teve participação pessoal e direta em todos os atos, tratando-se do gestor que tinha contato direto com o representante legal da empresa e permitia a execução indevida dos serviços”.

 

JOILSON ROCHA NUNES (Pretinho), enquanto Prefeito Municipal, “estava ciente de todas as tratativas ilícitas travadas e autorizou expressamente a contratação direcionada e a execução indevida e informal dos serviços, diante de seu comprometimento político com o empresário”.

 

Por sua, CHRISTIAN PINTO FARIA e sua empresa CLASSE LOCAÇÃO DE EQUIPAMENTOS E ENTRETENIMENTOS, SERVIÇOS E MÃO DE OBRA EIRELI “foram os particulares que concorreram e se beneficiaram do esquema de direcionamento da contratação e de prestação de serviços informais, sob a promessa de compensação futura.