No Brasil, considerando-se a maioridade penal aos 18 anos completos, aplica-se aos menores medidas sócio-educativas. No caso do atirador de 16 anos que invadiu duas escolas em Aracruz, executando ataques a tiros que causaram a morte de quatro pessoas e deixaram outras 12 feridas na última sexta (25), já é sabido que ele não ficará preso em penitenciária comum.

 

Devido à gravidade dos fatos, é possível prever que o adolescente tem chances de cumprir três anos de internação no Instituto de Atendimento Socioeducativo do Espírito Santo (Iases), que é o tempo máximo de permanência nesta modalidade penalizadora, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

 


 

 


 

Ocorre que, segundo o juiz da Vara da Infância e Juventude de Colatina, Ewerton Nicoli, à reportagem da TV Vitória, não há previsão expressa na legislação sobre o caso do adolescente com transtornos graves, que ofereçam riscos à sociedade, no sentido de permanecer por mais tempo em alguma instituição, em vez de conquistar a liberdade três anos após o início da internação.

 

Apesar disso, ele explica que há decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação ao maior que pratica o crime e tem transtorno mental, em que é oferecida medida de segurança por tempo correspondente à pena aplicada. Além disso, o Ministério Público pode entrar com ação para que a pessoa seja declarada incapaz para os atos da vida civil.

 

Já no caso do ato infracional cometido pelo adolescente no atentado em Aracruz, dentro do Iases, ele ficaria até, no máximo, os 19 anos e, a cada seis meses, o Judiciário pode reavaliar a situação do menor.

 

Para o juiz de Colatina, no caso do adolescente que acabou tirando a vida de três professoras e uma aluna, se ficar comprovado que o suspeito tem problemas mentais de alto comprometimento, a lei prevê que o menor deve ser restituído à família e mantido sob acompanhamento do Estado, realizando tratamento adequado.

 

Ainda de acordo com o magistrado, em situações excepcionais, em que o adolescente oferece riscos à sociedade, seria obrigação do Estado providenciar uma instituição adequada. “E aí não se trata de presídio para pessoas com transtorno mental, mas sim de um ambiente especializado para tratar a doença. Nesse caso, pelo tempo que for necessário”, disse.

 

Segundo o Iases, ao final do cumprimento da medida socioeducativa, os adolescentes com transtorno psiquiátrico são liberados após o alvará judicial, como ocorre em todos os outros casos.

 

 

Comparação com caso Champinha

Um caso emblemático acontecido em São Paulo e lembrado nacionalmente, ocorrido ainda em outubro de 2013, traz uma possibilidade que poderia vir a ser aplicada ao adolescente capixaba que praticou graves crimes em Aracruz.

 

Naquele ano, um garoto de 16 anos, Roberto Aparecido Alves Cardoso, o “Champinha”,  violentou e assassinou a estudante Liana Friedenbach, além de ter sido o mentor do homicídio do namorado dela. Depois do caso, que teve requintes de crueldade, o menor foi enviado à antiga Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor (Febem).

 

Acontece que, passados três anos dos crimes bárbaros, Champinha não retornou às ruas.

 

À reportagem do Folha Vitória, o advogado criminal Israel Domingos Jorio, doutor em Direitos e garantias fundamentais e professor de Direito Penal da Faculdade de Direito de Vitória (FDV), explicou que, de fato, naquela situação, tal qual a da tragédia capixaba, não havia medida de natureza penal para aplicar aos fatos praticados aos suspeitos quando fizessem 18 anos, nem medida da Vara de Infância e Juventude, já que a medida já havia sido finalizada.

 

“MAS O MINISTÉRIO PÚBLICO CONSEGUIU, NO CASO DO CHAMPINHA, UMA MEDIDA DE INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA DE NATUREZA PSIQUIÁTRICA, PORQUE ELE REPRESENTAVA RISCO A ELE MESMO E À SOCIEDADE. É PARECIDO COM A INTERNAÇÃO COMPULSÓRIA POR DEPENDÊNCIA DE DROGAS ILÍCITAS. TEM QUE TER AUTORIZAÇÃO JUDICIAL, LAUDOS MÉDICOS E NÃO TEM CARÁTER DE PENA. É UM TRATAMENTO E NÃO TEM TEMPO DETERMINADO, MAS DURA ENQUANTO PERSISTIR O QUADRO DE PERICULOSIDADE. ESSA MEDIDA REALMENTE EXISTE”, ESCLARECEU.

 

Nesse sentido, caso transcorram os três anos aplicáveis ao caso do adolescente capixaba que matou quatro pessoas, e a Justiça entenda cabível uma internação por motivos psiquiátricos, pode ser que o menor não volte logo às ruas.

 

Entenda a tragédia ocorrida após ataques em escolas

Duas escolas de Aracruz foram alvos de ataques na manhã desta sexta-feira (25). Segundo a Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo, duas professoras e uma adolescente morreram no local. Outra professora não resistiu aos ferimentos e morreu no hospital neste sábado (26).

 

 

Os crimes aconteceram pela manhã, primeiro na Escola da Rede Estadual Primo Bitti, e em seguida na escola particular, no Centro Educacional Praia de Coqueiral (CEPC).

 

Os ataques foram realizados por um adolescente armado com uma pistola .40, pertence a um tenente, pai do jovem, e um revólver 38, arma particular do policial militar.

 

O adolescente, que confessou o crime, não terá o nome divulgado por ser menor de idade. No momento do ataque, ele usava roupa camuflada, uma máscara de caveira e um bracelete com o símbolo nazista.

 

O suspeito chegou ao local a bordo de carro no modelo Renault Duster, cor dourada e com as placas cobertas. Ele entrou primeiro na escola estadual, onde atirou contra professoras. Duas delas morreram no local.

 

Em seguida, ele entrou no carro e se dirigiu para a escola particular, onde entrou correndo e efetuou diversos disparos. Uma adolescente morreu.

 

Sete feridos foram liberados após atendimento, mas cinco pessoas continuam internadas em hospitais de Vitória.

 

O que diz a defesa?

A advogada de defesa do adolescente, Priscila Benichio Barreiros, disse, neste sábado (27), que aguarda a representação do Ministério Público do Espírito Santo para se posicionar sobre o ocorrido. Segundo Priscila, o adolescente está internado.

 

À reportagem da TV Vitória, o especialista em Direito, Jordan Lemos, explicou que não há prisão preventiva quando se trata de menor infrator.

 

“Há uma medida de internação provisória. Essa medida de internação provisória tem o prazo máximo de 45 dias. Então o Judiciário tem, em tese, 45 dias para processar, julgar e sentenciar. Se passar desse prazo e não sair a sentença, o menor deve ser restituído aos pais ou responsáveis”, disse.