Maria Thereza Goulart foi considerada a mais bela e jovem primeira-dama do mundo. No tempo em que residiu no Palácio da Alvorada com os filhos Denize e João Vicente, entre setembro de 1961 e março de 1964, sua imagem revestiu de encanto o mito do marido, o presidente João Goulart (1918-1976).

 

Atração das festas, mereceu as capas de revistas europeias e uma reportagem especial da “Time”, que a comparou com Jackie Kennedy. Como Jackie, mantinha-se muda. Procurou calar pelo resto da vida, ao ser levada ao exílio, à viuvez e à volta traumática ao Brasil.

 

O desinteresse da imprensa pelo que pensava e seus projetos lhe provocou revolta. Hoje com 81 ou 83 anos (não revela idade), faz revelações ao jornalista Wagner William. O resultado é “Uma mulher vestida de silêncio”, volume de 644 páginas lançado pela editora Record. Durante 14 anos, as conversas resultaram em 80 horas de gravação, complementadas com pesquisas em arquivos e jornais, além de diários e cartas.

 

Entre os fatos inéditos, destacam-se pensamentos e estados psicológicos de Maria Thereza. Segundo William, além de tímida, sofre síndrome de pânico. O distúrbio a teria induzido a uma tentativa de suicídio na adolescência, “para chamar atenção dos pais”. O período mais feliz da sua vida foi nos anos 1950, quando Jango era vice-presidente e moravam em Copacabana.

 

Revista na prisão

 

Ficou deslumbrada com as festas em sua homenagem, mas se cansou da fama em seguida. Conta que, no comício de 13 de março de 1964 no Rio ­— que serviu como pretexto para a deposição de Jango — baixou os olhos e só pensava em como sair dali. Ao contemplar a multidão com bandeiras comunistas, disse ao amigo, o ministro da Educação Darcy Ribeiro: “São muitas bandeiras vermelhas. Isso não é coisa boa!”

 

No exílio uruguaio, sentiu-se quase tão feliz como na fase de Copacabana e tentou convencer Jango a não voltar para o Brasil. O casal adorava circular pela Europa, caçar, atirar, cavalgar e disputar corridas em carros velozes. “Jango, vamos ter um filho aqui”, suplicou. Ele respondeu com sarcasmo: “Imagina, que coisa ridícula. Como eu posso ter um filho que vai nascer no Uruguai?”.

 

“Maria Thereza sentiu pavor das bandeiras vermelhas. ‘Isso não é coisa boa’, disse no palanque ao ministro Darcy Ribeiro”

 

Mesmo banida do Brasil, teimava em cruzar a fronteira — e era escoltada de volta. Em 1971, passava de Fusca com a prima Terezinha pela cidade de Rio Grande quando a polícia levou-as a um quartel. Lá, uma policial mandou que tirasse a roupa: “A calcinha também? Por quê?” “Porque sim, porque tenho ordens”.

 

Estava certa de que seria torturada, mas foi solta. Nunca contou a Jango, para evitar sua fúria. Desaprovava a obsessão política do intrépido marido, que planejava retornar ao Brasil a partir de Paris, mas morreu na Argentina em 6 de dezembro de 1976. A família crê que ele tenha sido envenenado pela CIA. Todos, exceto Maria Thereza.

 

De volta ao Brasil, repetiu por duas décadas a quem lhe pedia entrevistas: “Vocês vão deturpar o que eu digo”. Viveu com discrição, sem deixar de namorar e frequentar a noite. Queria ser escritora e fotógrafa, mas não deu continuidade aos planos. “Até hoje ela não se sente em casa no Brasil”, afirma William. “Muda sempre de endereço. É como se não reconhecesse mais o lugar em que nasceu.”