A alta do preço de alguns alimentos, principalmente aqueles que compõem a cesta básica, e a chegada de itens em menor quantidade que a encomendada têm feito supermercadistas limitarem o volume de produtos que podem ser adquiridos pelo mesmo cliente. O objetivo é não permitir que poucas pessoas comprem muita quantidade e deixem as prateleiras vazias para as demais.



A prática foi confirmada nesta quinta-feira (10) pelo superintendente da Associação Capixaba de Supermercados (Acaps), Helio Schneider. Em entrevista à Rádio CBN, ele disse que a medida impede que faltem produtos importantes como arroz e óleo nos estabelecimentos, ao mesmo tempo em que "segura" os preços.  



"O supermercadista faz isso, pois o estoque que ele tem é mais baixo e ele sabe que, da próxima vez, ele vai comprar aquele produto bem mais caro, porque o mercado está crescente. Ele se preocupa com o cliente", afirmou.



Segundo ele, como os preços ainda estão em trajetória de alta, cada novo lote de arroz ou óleo que o empresário compra custa mais caro que o anterior. Se o lote mais antigo é vendido muito rapidamente, ele é obrigado a disponibilizar mais cedo o lote mais recente, que tem o preço mais alto.



"Ele limita para atender a clientela, para equacionar. Senão, chega amanhã, alguém pega tudo de uma vez e ele vai ficar sem. O empresário já está sabendo, porque já fez a compra, que a próxima será com preço mais alto", esclarece Schneider.



Outras fontes do setor afirmam que a limitação também impede que donos de padarias e pequenas mercearias comprem grandes quantidades para revender ainda mais caro, fazendo baixar ainda mais o estoque nos supermercados.



O superintendente da Acaps afirmou que as autoridades como o Ministério da Agricultura e a Secretaria Nacional do Consumidor estão cientes dessa prática. Foi preciso oficiá-los porque, segundo o Código de Defesa do Consumidor, é proibido limitar a quantidade de produto oferecido sem justa causa.


Schneider pediu que os consumidores não façam estoque de alimentos, justamente para evitar uma corrida aos supermercados, o que elevaria ainda mais o preço dos produtos. "O consumidor tem que ter criatividade para superar esse período. Nós vamos superar como superamos problemas mais sérios em outras épocas. Faltar (alimentos), acredito que não vai faltar. Estamos torcendo para isso não acontecer."


POR QUE OS ALIMENTOS ESTÃO TÃO CAROS?



Especialistas afirmam que uma conjunção de fatores provocou a elevação no preço dos alimentos. O principal deles é a alta do dólar que, além de encarecer os insumos industriais e agrícolas, torna o mercado externo mais atrativo. Soma-se a esse fator uma redução da disponibilidade de alguns produtos, seja por redução na produção esperada, seja por conta da entressafra.

Alta do dólar


O preço da moeda americana em relação ao real subiu bastante desde o início da pandemia, passando dos R$ 5 já em março. O primeiro impacto dessa alta é o aumento nos custos de produção, já que boa parte dos insumos industriais e agrícolas são cotados em dólar. É preciso considerar ainda que o transporte dos alimentos é feito principalmente por via rodoviária, o que demanda derivados do petróleo (diesel e gasolina) também cotados em dólar. O aumento nesse custo é repassado por toda a cadeia até chegar a nós, consumidores finais.
    
 


O segundo impacto da valorização da moeda americana é a competição com o mercado externo: para os produtores, vender para outros países, principalmente a China, se torna mais vantajoso. Isso significa que é preciso que empresas brasileiras paguem mais para que o produto fique no país. Esse custo também chega aos consumidores.  Foi o que aconteceu com o óleo de soja. Neste ano, o Brasil já exportou mais soja do que em todo o ano passado e compradores  estrangeiros já começaram a adquirir a produção de 2022. Com tanta disputa pelo produto, há o aumento no preço.
 
 

Entressafra e queda na produção


Alguns dos alimentos que tiveram alta nos preços estão em entressafra, ou seja, em um período em que é esperada uma produção menor e, consequentemente, um preço mais alto. É o caso das carnes de boi e de porco. Já no caso do leite, houve uma queda na produção de 50% por conta de fatores climáticos. Com menos leite, os laticínios também subiram de preço.  O caso do arroz é mais complexo. Houve redução da produção provocada pelo encolhimento da área plantada. Ou seja, produtores rurais optaram por plantar insumos com maior rentabilidade, como a soja, deixando pouco espaço para o arroz. A redução na produção foi de 30% desde 2012. Paralelamente, houve uma grande demanda mundial pelo produto no início da pandemia (no período em que muitas pessoas estocaram alimentos, lembra?). Com isso, as exportações cresceram 98% em relação ao mesmo período do ano passado. Com produção menor e disputa internacional, o preço, é claro, sobe.
    
 

Consumo

O consumo das famílias também influenciou na alta dos preços, embora especialistas salientem que esse não é um dos fatores principais. No início da pandemia, esse aumento foi provocado pela corrida aos supermercados em busca de alimentos para estoque. Segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio (CNC), enquanto os demais lojistas amargavam perdas expressivas com os decretos de fechamento e outras medidas de controle do coronavírus, os supermercados tiveram crescimento de 14,6% entre fevereiro e maio. Com restaurantes fechados, esse consumo se manteve elevado, já que as pessoas passaram a cozinhar em casa. O setor registrou ainda um aumento na venda de cestas básicas, não por causa das pessoas de baixa renda, mas por empresas e pessoas com maior poder aquisitivo que contavam em fazer doações.
    
Efeito auxílio emergencial / FGTS


Desde abril, o auxílio emergencial já foi pago a mais de um terço dos brasileiros e injetou quase R$ 80 bilhões na economia do país. Segundo dados da FGV, por causa do auxílio, a renda média de um trabalhador sem escolaridade cresceu 156%. Se considerados todos os trabalhadores, o incremento foi de 24%. Com mais dinheiro nas mãos, é natural que as pessoas comprem mais comida, o que elevou a procura, principalmente pelos itens da cesta básica, contribuindo com o aumento dos preços. Também foi liberado durante a pandemia o saque emergencial do Fundo de garantia por Tempo de Serviço (FGTS), no valor de até R$ 1045