O Ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, anunciou nesta quarta-feira (17), que o governo está preparando um “Desenrola Campo”, programa para renegociação de dívidas para agricultores familiares, como parte das medidas da Reforma Agrária. O modelo do programa será baseado no Desenrola Brasil. 

Um dos mecanismos para ampliar o acesso ao crédito agrícola, segundo Teixeira, será a criação de um fundo de aval, mantido pelo próprio governo.  “Nosso grande esforço é fazer o crédito chegar ao pequeno agricultor sem muitas posses. Um dos obstáculos para conseguir financiamento é que o pequeno agricultor, a pequena agricultora, não consegue avalista. E nós vamos construir este fundo de aval”, afirmou. Essa ferramenta já é utilizada no Desenrola Brasil: o governo federal é avalista dos inadimplentes. 

Outra possibilidade, segundo proposta apresentada pelo MST, será a troca de dívidas por produção, por comida. Segundo Gilmar Mauro, da coordenação nacional do MST, esse tipo de operação financeira pode ajudar também na contenção dos preços dos alimentos e no combate à fome e à insegurança alimentar. 

Seguindo o calendário de anos anteriores, as novas linhas do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) devem ser anunciadas em junho, quando são aguardadas novas regras para renegociação de dívidas e de acesso a financiamento. 

A inadimplência é um obstáculo para a obtenção de novos financiamentos. Por essa razão, o MST e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) reivindicam avanços na solução de dívidas junto ao Pronaf.  

Outra demanda dos movimentos que representam a luta pela reforma agrária e a agricultura familiar é a reformulação das exigências para obter créditos novos, abrindo espaço para agricultores de pequenas propriedades, cuja estrutura e dimensão, atualmente, estão aquém dos critérios adotados. 

Segundo o MST, existem aproximadamente 4 milhões de agricultores familiares sem acesso a crédito, há pelo menos cinco anos, desde o início do governo Bolsonaro. “Este é um drama”, diz Gilmar Mauro, da coordenação nacional do MST. Ele informa que entre os sem-crédito existem agricultores que estão inadimplentes e outros, cujas propriedades, embora inseridas em assentamentos, não se enquadram nas exigências. 

Presidente da Contag, Aristides Veras dos Santos explica que em sua base de representação há 2 milhões de propriedades rurais de até dez hectares, dimensão considerada insuficiente para cumprir critérios de financiamento. Outro obstáculo para obtenção de crédito, explica ele, se dá em propriedades compartilhadas por integrantes de uma mesma família que constroem, em um único terreno, mais de uma benfeitoria, como galpões e estufas, por exemplo. Essas propriedades passam a ser consideradas estabelecimentos rurais diferentes. 

“Embora seja uma única propriedade, com trabalho compartilhado, se considerados de forma isolada pelos bancos, têm dificuldade de acessar as linhas de crédito do Pronaf”, explica Aristides. Além de mudanças nesses critérios, a Contag reivindica aumento nas verbas de fomento à agricultura familiar, para R$ 20 mil por propriedade. Em 2023, segundo ele, o valor foi de R$ 4,6 mil. 

Terra da Gente e Jornada de Lutas

A proposta de troca de dívidas por comida, do MST, foi apresentada ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em encontro no final do ano passado, segundo Mauro. A ideia está em sintonia com a aumento da produção de alimentos saudáveis, principal bandeira da Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária: Ocupar para o Brasil Alimentar. 

O MST realiza a Jornada desde o último dia 15. Também conhecida como Abril Vermelho, a Jornada marca a lembrança do dia 17 de abril de 1996, data em que ocorreu o Massacre de Eldorado dos Carajás, quando 21 sem-terra foram mortos pela polícia militar do Pará 

A reivindicação por novos critérios para financiamento agrícola faz parte da avaliação que MST e Contag fazem do programa Terra da Gente, anunciado na última segunda-feira (15) pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pelo ministro Teixeira. 

Em entrevista à Agência Gov, Gilmar Mauro, do MST, enxerga avanços e soluções criativas no programa Terra da Gente. “São muito boas no médio prazo. Preveem a destinação de terras de grandes devedores, a troca de dívidas dos estados por terras e a destinação para reforma agrária de terras em posse de bancos públicos”, avalia. 

No entanto, Mauro considera que o orçamento atribuído ao programa, de R$ 520 milhões, é insuficiente. “Com este montante, eu duvido que consigam cumprir a meta anunciada de assentar 74 mil famílias este ano”. Na opinião do dirigente do MST, equacionar a questão do crédito para agricultura familiar pode ser uma forma de avançar na reforma agrária, dentro dos limites do orçamento atual. 

Para Aristides, da Contag, o programa Terra da Gente teria tido impacto mais positivo se houvesse sido debatido mais amplamente com os movimentos sociais e as universidades. “O governo poderia ter pensado num plano mais geral, amarrando mais detalhes que ficaram soltos, como um orçamento maior para o Incra”, diz.