A Justiça do Trabalho do Espírito Santo condenou uma clínica odontológica da Serra, na Grande Vitória, ao pagamento de indenização de R$ 20 mil por prática de racismo religioso contra uma funcionária. Segundo o processo, uma operadora de telemarketing era chamada de "macumbeira e fedorenta" pelas chefes. O nome da empresa não foi divulgado e ambas as partes já recorreram da decisão.

A decisão é de quinta-feira (4). Na reclamação trabalhista, a empregada alegou que sofreu humilhações e perseguições por parte de sua chefe, que a chamava de "macumbeira" e "fedorenta" na frente das outras empregadas.

Tanto a empresa quanto a funcionária recorreram da decisão. O processo teve início em 2022 e a vítima trabalhou na empresa entre 2019 e 2022. No processo não há referência ao período exato em que a trabalhadora sofreu o assédio.

Diante da gravidade dos fatos narrados, o relator do acórdão, desembargador Claudio Armando Couce de Menezes estipulou o valor da indenização em R$ 20 mil.

"É certo que brincadeira e descontração, ou o que quer que esteja dentro desta mesma ordem de ideias, são atitudes saudáveis que requalificam o ambiente de trabalho com uma atmosfera leve e positiva. Contudo, é inegável também que ofender a honra, a dignidade e a moral de um ser humano, não representa uma simples brincadeira, mas sim assédio moral. Principalmente no caso em análise, em que a autora foi violentada moralmente também no que diz respeito às suas crenças religiosas e à sua fé individual", pontuou o desembargador Claudio Armando Couce de Menezes na decisão.

Testemunhas ouvidas no processo confirmaram as ofensas sofridas pela colega. Segundo elas, a supervisora sempre efetuava comentários sobre a roupa e o cabelo da funcionária e, com frequência, afirmava que "estava fedendo" e que era "macumbeira".

Uma das testemunhas contou que a gerente levou uma pastora para fazer um momento de oração antes do início da jornada. Após realizar o culto, a pastora disse que havia um “clima pesado e de trabalhos espirituais” na empresa e a gestora afirmou que a causadora era a “macumbeira” que trabalhava no local.

Os depoimentos também confirmaram que a supervisora utilizava "palavrões" de "brincadeira", para se comunicar com a funcionária, a qual chamava de “vagabunda" e "vaca".

Em outro trecho da decisão, a funcionária conta que as chefes a colocavam em situações constrangedoras.

"Aduz a autora, em síntese, que durante o seu contrato de trabalho sofreu humilhações e perseguições por parte de suas chefes que a chamavam de "macumbeira" e "fedorenta" na frente das outras colaboradoras. Destaca que ela sempre era colocada na baia que batia mais sol como forma de perseguição", apontou decisão.

A sentença entendeu o assédio moral sofrido pela autora e deferiu o pagamento de indenização.

Para a juíza Denise Alves Tumoli Ferreira, da 9ª Vara do Trabalho de Vitória, “questões relacionadas à religiosidade não devem ser motivo de chacota ou brincadeira, por acabarem por reiterar ideias preconceituosas no âmbito de nossa sociedade, sobretudo no meio ambiente de trabalho, local onde se passa a maior parte do dia e que se deve prezar ao máximo pelo clima de respeito nas relações interpessoais”.

O relator do processo na segunda instância considerou as práticas adotadas pela empresa extremamente degradantes e causadoras de grave dano moral. Segundo ele, “restou demonstrado pela prova oral que a autora foi vítima de racismo religioso”.

Em sua decisão, o magistrado reforça que a liberdade de consciência e de crença é direito fundamental, cristalizado no art. 5º, VI, da Constituição Federal, sendo assegurado ainda, na forma da lei, o livre exercício dos cultos religiosos e garantida proteção aos locais de culto e a suas liturgias.