O menino pobre e trabalhador de Cachoeiro de Itapemirim que ganhou o coração dos torcedores de vários clubes brasileiros e da América Latina, goza da amizade de grandes astros de futebol, tornou-se uma espécie de rei dos estádios do Peru, mas que nunca recebeu uma coroa, nem de flores, e pouco se importa com isso.

Este é Carlos Henrique Paris Rosa, ou simplesmente Carlos Henrique, ponta-esquerda veloz, que hoje, aos 62 anos de idade, vive como um bem-sucedido empresário nos Estados Unidos e planeja o retorno definitivo ao Brasil, para o Espírito Santo, de onde saiu em 1979, da Desportiva Ferroviária, para ganhar o mundo, a partir da grande nação rubro-negra, ao integrar o poderoso time do Flamengo de Zico. E, para isso, começa a fazer investimentos empresariais no Estado, em sociedade com seus irmãos. 


 


Descobri Carlos Henrique morando em Baltimore, cidade portuária da costa leste americana, a  mais populosa do Estado de Maryland, com cerca de 700 mil habitantes, onde ficam a Universidade Johns Hopkins e o Hospital Johns Hopkins. Depois de alguns dias trocando mensagens, ele aceitou conceder-me essa entrevista exclusiva e inédita por telefone – a primeira a um jornalista brasileiro depois de mais de 20 anos. 

Baltimore, próspera cidade do leste norte-americano, é onde Carlos Henrique construiu sua vida fora do futebol


Qual a razão desse isolamento? Carlos Henrique viveu grandes histórias, mas quer distância do ambiente do futebol, onde passou pelo menos 18 anos de sua vida, desde a geração de ouro da Desportiva, formada em 1977-78 e que veio a resultar num dos melhores times profissionais de Jardim América, que obteve sua melhor campanha em Brasileiros em 1980, ano em que o Flamengo obteve seu primeiro título nacional.


“Eu quero distância do futebol, Caldas, porque o futebol é muito triste. Vivem tentando falar comigo, mas o máximo que fiz foi falar a uma rádio de Londrina há uns 10 anos. Não falo de futebol, não falo com jornalistas. Quero ficar longe”, disse Carlos Henrique, em meio a quase duas horas de conversa telefônica. Mas por que Carlos Henrique aceitou falar comigo? Qual foi o gatilho? 


Carlos Henrique deixou os gramados aos 36 anos, no Sport Boys, de El Callao, uma província peruana na região metropolitana de Lima, time que ajudou a conquistar o título da segunda divisão e subir para a primeira, onde conquistou, em 1984, o último de seus seis campeonatos peruanos. 


Sua importância para o time peruano é representada pela foto que decora, em tamanho gigante, a sede do clube, e que ilustra essa reportagem no mês em que completo 46 anos de profissão, iniciada quando eu tinha apenas 14 anos e morava em Alegre. Foi com 14 anos também que Carlos Henrique começou a trabalhar na Fábrica de Cimento Ouro Branco, da Nassau, em Cachoeiro. 


“Sou mais conhecido no Peru, onde vivi por 15 anos, do que no Brasil”, diz Carlos Henrique, misturando português e espanhol, resultado de mais da metade de sua vida vivida entre países de língua “hespanica” e no estado norte-americano.


Mas por que isso aconteceu? O que houve em sua passagem pelo Flamengo e por que, no auge da forma física, deixou o clube? Ele poderia estar na mágica Seleção Brasileira que encantou o mundo em 1986, mas por que, explodindo no Palmeiras, deixou de ser convocado para a Seleção Brasileira por Telê Santana?


Carlos Henrique jogou no Flamengo de Zico, campeão brasileiro de 1980; no América do Rio; no Palmeiras, em 1983 e 1984, ao lado de outros craques como goleiro João Marcos, o zagueiro Luiz Pereira, o meia Batista e o atacante Jorginho; no Londrina, onde tornou-se um dos jogadores mais importantes da história do clube; no Atlético Paranaense, no Uberlândia e no Criciúma, seu último clube no Brasil.



Antes de “explodir” no Sport Boys, jogou no Cerro Porteño, do Paraguai, e no Barcelona de Guayaquil, Equador, para onde foi levado pelo então técnico Edu Coimbra, irmão de Zico. Nessa época, viveu uma curiosa história com o Galinho de Quintino.

 


Carlos Henrique vive com estilo, como próspero empresário nos Estados Unidos


As histórias desse capixaba, que pouco é lembrado não apenas no seu Estado, mas no próprio futebol brasileiro, e que “sumiu do mapa”, como ele vive e o que faz nos Estados Unidos, seus planos para o futuro e a razão de considerar triste o futebol, que tantos dizem ser “a alegria do povo” e que, talvez por isso, usa o “não lembrar” como mecanismo de defesa... 


Eu prometo contar, não apenas isso, mas também que existe uma coisa que Carlos Henrique não se esquece: de suas origens e de quem o ajudou nos primeiros anos de sua vida e de sua carreira. Tudo nesta série de reportagens, a partir de hoje, todos os sábados e quartas-feiras, na “Folha do Espírito Santo”.
Então, até quarta.